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Entenda o que é violência psicológica, como identificar seus sinais, quais são os impactos e o que diz a Lei Maria da Penha. Saiba como buscar apoio.

  • Foto do escritor: Instituto Emancipar
    Instituto Emancipar
  • 29 de mai.
  • 15 min de leitura

Atualizado: 9 de jun.

A violência psicológica é um tipo de abuso silencioso e persistente que atinge a saúde emocional e mental de quem a sofre. Ela se manifesta por meio de controle, humilhação, manipulação e chantagens que minam a autoestima, a autonomia e a capacidade de decisão da vítima. Apesar de não deixar marcas visíveis, seus efeitos podem ser devastadores. Neste texto, explicamos como identificar os sinais da violência psicológica, quais são suas consequências, o que diz a Lei Maria da Penha sobre o tema e onde buscar apoio para romper com esse ciclo.


Violência Psicológica entre casais: Impactos, Desafios e a Efetividade da Lei Maria da Penha

A violência psicológica é uma das formas mais insidiosas de abuso, frequentemente invisível e subnotificada. Embora a violência física seja amplamente reconhecida e tratada pela sociedade, o abuso psicológico muitas vezes é minimizado, sendo interpretado como "conflito normal" em um relacionamento. No entanto, seus efeitos podem ser tão devastadores quanto a violência física e afetam profundamente a saúde mental das vítimas. Este artigo discute como reconhecer a violência psicológica, seus efeitos duradouros, a eficácia da Lei Maria da Penha e o papel fundamental do Ligue 180, um serviço essencial de apoio às mulheres vítimas de violência.

O que é Violência Psicológica?

A violência psicológica é caracterizada por qualquer comportamento que prejudique o bem-estar psicológico da vítima, afetando sua autoestima, confiança e autonomia. Esse tipo de abuso é difícil de identificar, pois não deixa marcas físicas visíveis, mas pode causar danos profundos e duradouros à saúde emocional e mental da vítima.


Segundo a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), a violência psicológica envolve ações que causam dano à autoestima, sofrimento emocional, humilhação, manipulação ou controle. Essa forma de violência é uma das mais difíceis de ser comprovada, pois suas marcas não são físicas e, muitas vezes, a vítima não consegue identificar a gravidade do abuso até que ele tenha causado danos significativos à sua saúde mental.


A violência psicológica pode envolver humilhações, insultos, controle excessivo e manipulação emocional, como o gaslighting, uma prática na qual o agressor leva a vítima a duvidar da própria percepção da realidade. Esse tipo de conduta enfraquece progressivamente a confiança da vítima, gerando confusão e insegurança emocional. A pessoa afetada passa a questionar seus sentimentos, sua memória e até sua sanidade, tornando-se emocionalmente dependente do agressor e com cada vez menos recursos para romper o ciclo de abuso.


Características da Violência Psicológica

A violência psicológica pode se manifestar de diversas maneiras. As principais características desse tipo de abuso incluem:


1. Humilhação constante

A humilhação constante pode se manifestar por meio de insultos, zombarias e críticas destrutivas, visando minar a autoestima da vítima. A agressão psicológica nesse caso atinge o psicológico da mulher de maneira profunda, levando a vítima a duvidar de seu valor pessoal.


Exemplo prático:  Um exemplo comum de humilhação constante é o parceiro que chama a mulher de "incompetente", "burra" ou "feia", não importa o que ela faça. Com o tempo, essa mulher começa a acreditar nessas afirmações e sente-se cada vez mais insegura e sem confiança em suas próprias capacidades.


2. Manipulação emocional (Gaslighting)

O gaslighting é uma técnica de manipulação emocional em que o agressor faz a vítima duvidar de sua própria percepção da realidade. Esse tipo de abuso cria confusão e insegurança, além de fazer a vítima questionar sua memória, seus sentimentos e sua sanidade.


Exemplo prático:  Em um relacionamento abusivo, o agressor pode negar ou distorcer o que foi dito ou feito, fazendo com que a vítima se sinta confusa e comece a acreditar que está exagerando ou "perdendo a cabeça". Por exemplo, um homem pode negar ter gritado com a mulher, mesmo que ela tenha claramente ouvido, e depois dizer: "Você está louca, nunca fiz isso, você só está imaginando coisas".


3. Controle excessivo

O controle excessivo acontece quando o agressor tenta controlar todos os aspectos da vida da vítima, desde suas decisões pessoais, atividades cotidianas até suas relações sociais. Isso pode se manifestar por meio de restrições sobre o que a vítima pode ou não fazer, onde pode ir ou com quem pode se relacionar.


Exemplo prático:  Um parceiro controlador pode tentar restringir a liberdade da mulher, como por exemplo, controlar suas finanças, limitando o acesso dela ao dinheiro ou proibindo-a de trabalhar. Em alguns casos, ele pode até mesmo ditar suas escolhas alimentares, roupas e amigos, dizendo o que ela pode ou não fazer em sua vida social.


4. Isolamento social

O agressor tenta afastar a vítima de amigos, familiares e outros suportes emocionais, deixando-a vulnerável e dependente dele. Esse isolamento muitas vezes é sutil, começando com críticas aos amigos ou familiares da vítima e evoluindo para a proibição total de contato com essas pessoas.


Exemplo prático:  Uma mulher que tem amizades próximas pode começar a ouvir do seu parceiro frases como: "Por que você precisa sair com essas amigas? Elas não se importam com você de verdade." Com o tempo, ela vai se afastando das pessoas que a apoiam, passando a depender mais do parceiro para apoio emocional. Em casos mais extremos, o agressor pode até mesmo mudar a vítima de cidade ou local de trabalho para impedir que ela tenha contato com os amigos e familiares.


5. Chantagem emocional

A chantagem emocional é uma tática manipulativa em que o agressor usa a culpa, o medo ou até ameaças de autolesão para controlar a vítima. Ele faz com que a vítima sinta-se responsável pela felicidade ou bem-estar dele, ameaçando punições se não seguir as suas ordens.


Exemplo prático:  Se a mulher decide terminar um relacionamento abusivo, o parceiro pode ameaçar se matar ou fazer algo drástico, fazendo com que ela se sinta culpada e ceda ao desejo dele de permanecer na relação. "Se você me deixar, eu não sei o que vou fazer com a minha vida", é uma frase comum utilizada nesse tipo de chantagem emocional.


Outras Formas de Manifestação da Violência Psicológica

Além das formas acima descritas, a violência psicológica pode se manifestar de outras maneiras, incluindo:


6. Desprezo constante

O desprezo constante envolve o agressor fazer a vítima se sentir inferior e desvalorizada, rejeitando seus sentimentos e necessidades emocionais. Esse tipo de violência muitas vezes é mais sutil, mas tão prejudicial quanto outras formas de abuso psicológico.


Exemplo prático:  O agressor pode desvalorizar qualquer esforço da vítima, como suas realizações profissionais ou pessoais. Se a mulher fala sobre suas conquistas, o agressor responde de maneira desdenhosa: "Isso não é nada, qualquer pessoa poderia fazer o mesmo". Ao longo do tempo, a vítima se sente desmerecedora de qualquer sucesso ou conquista.


7. Ameaças de vingança ou retaliação

Em algumas relações abusivas, o agressor utiliza ameaças de vingança ou retaliação, afirmando que a vítima sofrerá consequências caso desobedeça ou desafie o controle dele.


Exemplo prático:  O agressor pode ameaçar expor segredos íntimos da vítima para amigos ou familiares, caso ela tente terminar o relacionamento ou não siga as ordens dele. Pode também ameaçar prejudicar a carreira dela, caso ela não se submeta aos desejos dele.


Essas formas de violência psicológica geram um ciclo de abuso em que a vítima fica cada vez mais dependente do agressor e incapaz de perceber os danos que está sofrendo. Ao longo do tempo, esse ciclo pode resultar em depressão, ansiedade e, em casos mais graves, em transtornos psíquicos severos, como o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). A violência psicológica, portanto, não apenas afeta a saúde mental, mas também interfere na autonomia da vítima e sua capacidade de agir livremente.


É importante destacar que, muitas vezes, a vítima não reconhece que está em um ciclo de abuso psicológico, o que torna o processo de superação ainda mais desafiador. A conscientização sobre esses tipos de abuso é fundamental para que as mulheres possam se identificar e buscar apoio necessário para romper o ciclo de violência.




Como é possível explicar esse fenômeno?

Para entender um pouco sobre como esse fenômeno se desenvolveu ao longo do tempo, podemos apresentar os conceitos que o livro A Criação do Patriarcado nos apresenta  e como se originou a subordinação feminina, fator importante para que a violência psicológica ocorra.


A violência psicológica contra as mulheres é uma manifestação das relações de poder estabelecidas pelo patriarcado, que historicamente impôs a subordinação feminina. O conceito de patriarcado, conforme descrito por Gerda Lerner (1986) em A Criação do Patriarcado, remonta a uma estrutura social que favorece o controle masculino sobre as mulheres. Esse sistema consolidou-se ao longo da história, criando um modelo em que as mulheres foram mantidas em uma posição subalterna, não só economicamente, mas também emocionalmente.


Lerner (1986) explica que o patriarcado não se limita apenas a estruturas sociais e políticas, mas também se reflete nas relações pessoais, como a violência psicológica. O controle emocional das mulheres, imposto como uma prática normal, dificulta o reconhecimento da violência psicológica e sua denúncia, perpetuando o ciclo de abuso.


A Violência Psicológica e as Questões de Gênero, Raça e Classe

Além disso, não podemos deixar de destacar que a violência psicológica não afeta todas as mulheres de maneira igual. Fatores como classe social e raça desempenham um papel importante na vulnerabilidade das mulheres a esse tipo de abuso. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2023), as mulheres negras representam 68,2% das vítimas de violência psicológica no Brasil. Esse dado destaca a interseção entre gênero, raça e classe social, com mulheres negras enfrentando não só a violência psicológica, mas também outras formas de opressão que dificultam o rompimento com o ciclo de abuso.


Além disso, a dependência econômica desempenha um papel crucial na perpetuação da violência psicológica. Silvia Federici (2012), em O Patriarcado do Salário, argumenta que o controle sobre a autonomia financeira das mulheres é uma das bases que sustentam a violência doméstica. Mulheres em situação de vulnerabilidade econômica, muitas vezes sem autonomia financeira, são mais suscetíveis ao abuso psicológico, pois têm menos meios para escapar de relações abusivas.


A Dificuldade de Comprovar a Violência Psicológica: O Exemplo da Série Maid

A dificuldade em configurar a violência psicológica na justiça é um dos maiores desafios enfrentados pelas vítimas. A ausência de provas físicas torna o abuso psicológico difícil de ser comprovado, dificultando o processo de busca por justiça. Essa dificuldade é retratada na série Maid (2021), disponível na Netflix. A personagem Alex, que foge de um relacionamento abusivo, tenta obter benefícios legais após sair de casa. No entanto, ela enfrenta enormes obstáculos para provar o abuso psicológico que sofreu. Ela é constantemente questionada sobre a falta de provas físicas, um reflexo da realidade de muitas mulheres que sofrem abuso psicológico, mas não têm como provar seu sofrimento.


Este exemplo ilustra a realidade enfrentada por muitas mulheres que, embora vítimas de abuso emocional, encontram barreiras no sistema jurídico. O reconhecimento da violência psicológica como um abuso legítimo precisa ser fortalecido, com mudanças nas abordagens legais para lidar com o impacto emocional do abuso.

O Ligue 180: Um Canal Essencial de Apoio às Mulheres

A Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180 foi criada pela Lei n.º 10.714, de 2003, e implementada em 2005, visando fornecer suporte e orientação às mulheres vítimas de violência. Este serviço oferece atendimento gratuito e confidencial, 24 horas por dia, todos os dias da semana, tornando-se uma ferramenta crucial no enfrentamento da violência de gênero no Brasil. Com o aumento das denúncias e o crescente reconhecimento da violência psicológica como uma forma de abuso legítima, o Ligue 180 se tornou um canal essencial para mulheres que enfrentam essa problemática.


Inicialmente, o Ligue 180 se destinava a receber denúncias de diversas formas de violência, como física e sexual. Porém, desde 2020, a violência psicológica foi oficialmente incluída no rol de denúncias passíveis de registro no serviço, refletindo a crescente conscientização sobre os impactos desse tipo de abuso. A violência psicológica, muitas vezes invisível e difícil de provar, representa uma grande parcela das violações denunciadas. Em 2024, mais de 101 mil denúncias de violência psicológica foram registradas, refletindo a gravidade e a urgência da questão. Esse número é um indicador da relevância do Ligue 180 no enfrentamento de abusos que, até recentemente, eram muitas vezes ignorados pela sociedade e pela legislação.


Quando uma mulher entra em contato com a central, o atendimento é realizado por profissionais treinados, que asseguram uma escuta qualificada e prestam a devida orientação sobre os direitos da vítima. Além das informações sobre as formas de violência, o Ligue 180 oferece orientação sobre as leis de proteção, como a Lei Maria da Penha, que oferece instrumentos legais para garantir a segurança da mulher em risco. O serviço também auxilia na localização de redes de apoio e serviços disponíveis, como abrigos, serviços de saúde, atendimento psicológico, e assistência jurídica, orientando as mulheres sobre como acessar essas estruturas.


As vítimas de violência psicológica, em particular, são encaminhadas para serviços especializados, como as Casas da Mulher Brasileira e as Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam), onde podem receber o apoio necessário para iniciar o processo de recuperação e, quando necessário, realizar o registro oficial da denúncia. O Ligue 180 também pode solicitar a medida protetiva de urgência, um instrumento jurídico que visa resguardar a integridade da vítima enquanto o caso é investigado, garantindo que o agressor seja afastado e a vítima tenha sua segurança protegida enquanto busca justiça.


Além disso, o Ligue 180 tem um papel importante na coleta de dados, que contribuem para a formulação de políticas públicas mais eficazes para o enfrentamento da violência contra a mulher. O serviço registra as ocorrências de forma confidencial, mas com a devida articulação com as autoridades competentes, garantindo que as denúncias sejam tratadas com seriedade e urgência.


Em 2024, o Ligue 180 registrou um total de 573.131 violações contra mulheres, com 132.084 denúncias de violência, das quais 101.007 foram de violência psicológica. Essa informação demonstra que, embora o abuso físico ainda seja a forma mais visível de violência, a violência psicológica tem sido cada vez mais reconhecida e denunciada pelas mulheres. A maioria das vítimas relatou que as agressões ocorriam diariamente, com 46,4% indicando agressões diárias. O ambiente doméstico foi o local mais comum de ocorrência das violações, com 53.019 ocorrências na "casa da vítima" e **43.097 na casa onde reside a vítima e o agressor". Esse dado sublinha o papel central da casa como o espaço de maior vulnerabilidade para as mulheres que sofrem violência.


Através da orientação, do encaminhamento a serviços especializados e do apoio contínuo, o Ligue 180 se tornou uma ferramenta indispensável para ajudar as mulheres a romperem o ciclo de abuso e reconstruírem suas vidas. A existência de um canal como esse não apenas oferece uma linha direta de apoio para mulheres em situação de violência, mas também atua na educação e conscientização sobre os direitos da mulher, fortalecendo a rede de apoio social e institucional.


Em resumo, o Ligue 180 continua sendo um serviço essencial e uma ferramenta poderosa no combate à violência contra a mulher, com seu papel sendo ainda mais crucial à medida que o Brasil avança em sua luta por direitos e proteção à mulher. Ao oferecer suporte imediato, encaminhamentos adequados e informações sobre como se proteger legalmente, o serviço ajuda a restaurar a dignidade das vítimas, fornecendo um caminho para a recuperação e a justiça.

 

Consequências da Violência Psicológica

A violência psicológica tem consequências profundas e duradouras, que vão muito além do sofrimento imediato. Mulheres que enfrentam abusos psicológicos lidam frequentemente com transtornos emocionais graves, como transtornos de ansiedade, depressão e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Além disso, a violência psicológica mina a autoestima da vítima, deixando-a emocionalmente fragilizada e sem recursos para romper o ciclo de abuso. A psicóloga e ativista Maria da Penha Maia Fernandes, em seu livro "Sobreviver: A experiência da mulher vítima de violência" (2004, p. 34), descreve como a mulher vítima de violência psicológica perde sua autonomia emocional, muitas vezes sentindo-se incapaz de tomar decisões por conta própria, o que a mantém presa ao relacionamento abusivo.


1. Transtornos de Ansiedade

A constante humilhação e manipulação emocional causadas pela violência psicológica muitas vezes desencadeiam transtornos de ansiedade. A vítima começa a viver em um estado constante de medo e insegurança, e as situações cotidianas podem se tornar fontes de angústia e apreensão. Maria da Penha aponta que a ansiedade é uma das respostas mais comuns ao abuso psicológico, uma vez que a mulher se vê em um estado constante de alerta, temendo novas humilhações e ataques emocionais. Ela explica que o medo de ser desprezada ou de não atender às expectativas do agressor é uma forma de controle psicológico que prejudica a saúde mental da vítima (Fernandes, 2004, p. 58).


Exemplo prático:  Uma mulher que está em um relacionamento abusivo pode começar a sentir ataques de pânico toda vez que o parceiro chega em casa ou quando recebe uma mensagem de texto dele. Esse medo constante de ser humilhada ou criticada reflete o impacto emocional do abuso psicológico diário.


2. Depressão

Outro efeito devastador da violência psicológica é o desenvolvimento de depressão. As mulheres vítimas de abuso psicológico frequentemente se sentem desvalorizadas e impotentes, internalizando as críticas e humilhações do agressor. A sensação de não ser boa o suficiente, alimentada pelo comportamento abusivo, leva à perda de autoestima e pode resultar em um quadro de depressão profunda. Maria da Penha descreve como o isolamento e a desvalorização constante minam a confiança da mulher, levando-a a acreditar que não merece uma vida melhor e, muitas vezes, levando-a ao afastamento de sua rede de apoio social (Fernandes, 2004, p. 72).


Exemplo prático:  Após meses ou anos de abusos emocionais, uma mulher pode começar a se sentir incapaz de realizar até mesmo as tarefas mais simples, como trabalhar ou cuidar de si mesma, porque se sente constantemente inferiorizada pelo parceiro. Esse ciclo de desvalorização pode levar a mulher a desenvolver uma depressão severa.


3. Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)

A violência psicológica também pode causar o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), uma condição que ocorre após vivências de extrema angústia emocional. Mulheres que passam por abuso psicológico revivem frequentemente as experiências traumáticas por meio de flashbacks, pesadelos ou reações intensas quando se deparam com situações que lembram o abuso. De acordo com Maria da Penha (2004, p. 85), o TEPT surge como uma resposta ao trauma contínuo, em que a vítima revê mentalmente os episódios de abuso, gerando um estado constante de tensão emocional.


Exemplo prático:  Após um período de abuso psicológico, uma mulher pode, ao sair do relacionamento, reviver mentalmente a sensação de impotência e angústia ao se deparar com comportamentos semelhantes aos do agressor. Ela pode ter reações físicas intensas, como aumento da frequência cardíaca e sensação de pânico, sempre que se sentir novamente em uma situação de controle ou humilhação.


4. Baixa Autoestima

A baixa autoestima é uma das consequências mais imediatas e visíveis da violência psicológica. Com o tempo, as vítimas começam a acreditar nas críticas e humilhações repetidas, vendo-se como incapazes, inúteis ou indignas de amor e respeito. Maria da Penha observa que a desvalorização contínua resulta em uma perda da identidade da mulher, que se vê cada vez mais refém do agressor e sem confiança para tomar decisões independentes (Fernandes, 2004, p. 92). A mulher que vivencia abuso psicológico tende a se sentir isolada e desprotegida, sem recursos para se libertar do ciclo de abuso.


Exemplo prático:  Após meses ou anos de críticas constantes, uma mulher pode acreditar que não é capaz de realizar tarefas simples no trabalho ou em casa, por exemplo. Ela pode se afastar de amizades ou do ambiente profissional, sentindo que não é suficientemente boa para estar nesses espaços.


Impactos Profundos e Duradouros

Além das consequências emocionais e psicológicas imediatas, o abuso psicológico tem efeitos de longo prazo, como o desenvolvimento de síndrome de estresse pós-traumático e dificuldades de adaptação ao longo do tempo. A mulher que sofre de violência psicológica pode continuar a carregar as marcas do abuso por muito tempo, até mesmo após se afastar fisicamente do agressor. O reconhecimento dessas consequências é fundamental para que a sociedade e os profissionais de saúde possam oferecer apoio adequado às vítimas, ajudando-as a reconstruir sua autoestima e confiança.


Conclusão

Em conclusão, a violência psicológica entre casais revela-se uma forma de abuso insidiosa e frequentemente invisibilizada, caracterizada por comportamentos como humilhação constante, manipulação emocional, controle excessivo e ameaças veladas. Essas manifestações, embora não deixem marcas físicas, causam danos profundos: as vítimas sofrem frequentemente de ansiedade, depressão e transtorno de estresse pós-traumático, além de enfrentar uma severa perda de autoestima, ficando emocionalmente fragilizadas e sem recursos para romper o ciclo de abuso. Observa-se também que tal violência afeta de forma desigual diferentes grupos de mulheres: fatores interseccionais de raça, classe e gênero agravam a vulnerabilidade – mulheres negras e de classes socioeconômicas mais baixas, por exemplo, figuram desproporcionalmente entre as vítimas, evidenciando como o racismo e a desigualdade social potencializam os efeitos do patriarcado e dificultam o rompimento do ciclo de abuso. Reconhecem-se avanços importantes no enfrentamento dessa forma de violência: a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) estabeleceu formalmente a violência psicológica como crime e provê mecanismos de proteção às vítimas; além disso, canais de denúncia e suporte, como o Ligue 180, tornaram-se essenciais para orientar as mulheres e viabilizar as denúncias, ajudando a romper o silêncio e o ciclo de abuso. Observa-se um aumento expressivo no número de denúncias de abuso psicológico nos últimos anos, reflexo da maior conscientização social acerca do problema e da confiança crescente nas ferramentas de apoio disponíveis.  Entretanto, persiste um descompasso entre a existência das leis e sua efetiva aplicação: a falta de provas materiais e a dificuldade em tipificar juridicamente o abuso emocional ainda representam desafios significativos, muitas vezes levando à impunidade dos agressores e à revitimização das mulheres que buscam justiça. Ademais, lacunas estruturais subsistem, como a necessidade de capacitação contínua de profissionais para identificar e lidar adequadamente com casos de violência psicológica, bem como a urgência de políticas públicas interseccionais que abordem as raízes culturais e socioeconômicas desse fenômeno. Assim, embora os avanços legais e institucionais dos últimos anos sejam notáveis, a erradicação da violência psicológica demanda um esforço contínuo e multifacetado. É fundamental fortalecer a implementação da lei, aprimorar os mecanismos de prova e proteção, e promover mudanças culturais que afirmem a autonomia e a dignidade das mulheres.


Referências

  1. BRASIL. Lei nº 10.714, de 13 de agosto de 2003. Dispõe sobre a criação da Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 14 ago. 2003.

  2. BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 8 ago. 2006.

  3. FERNANDES, Maria da Penha Maia. Sobreviver: a experiência de uma mulher vítima de violência. Fortaleza: Fundação Maria da Penha, 2004.

  4. FEDERICI, Silvia. O patriarcado do salário: feminismo e a política do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2012.

  5. FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023. São Paulo: FBSP, 2023. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario/2023. Acesso em: 10 jul. 2024.

  6. HOOKS, Bell. O feminismo é para todo mundo: políticas feministas para todos. São Paulo: Editora da UNESP, 2000.

  7. LERNER, Gerda. A criação do patriarcado. 1. ed. Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1986.

  8. MAID. Direção: John Wells. Produção: Molly Smith Metzler. [Série de TV]. Estados Unidos: Netflix, 2021. 1 temporada.

  9. BRASIL. Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Violência contra a mulher: tipos e consequências. Brasília, DF: MMFDH, 2020. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br. Acesso em: 10 jul. 2024.

  10. MOREIRA, Terezinha S. Psicologia e violência doméstica: uma abordagem terapêutica. Psicologia & Sociedade, Belo Horizonte, v. 31, n. 2, p. 1–12, 2019. Disponível em: https://www.scielo.br. Acesso em: 10 jul. 2024.

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